quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Reflexões sobre a Organização Tríplice de Rudolf Steiner

Ivan Beteto C.’.M.’.
A.'.R.'.L.'.S.'. Stella Matutina" nº 658
Or.'. de São Bernardo do Campo - SP
enviado por email em 11/02/2016



 


 
 Após 30 anos de pesquisa na ciência espiritual, por meio da fenomenologia de Goethe, Rudolf Steiner em 1917 no livro Enigmas da Alma apresentou pela primeira vez a teoria da Organização Tríplice ou trimembração, que rompia radicalmente com a fragmentação da fisiologia de sua época. Alvo de inúmeras críticas, esta proposta de entendimento do organismo ainda hoje é motivo de incompreensão ou de compreensões equivocadas que se apegam mais a literalidade de seus termos ou a preconceitos de ordem diversa. Esta grandiosa pesquisa empreendida por Steiner apresenta uma nova forma de se ver homem e o seu corpo: um instrumento da alma em sua totalidade.

Steiner, para traduzir a fenomenologia das forças observadas no organismo, viu-se diante dos termos disponíveis na fisiologia e anatomia de sua época e assim, embora certamente não desejasse restringir-se a eles, teve de optar por denominá-los como: sistema neurossensorial, sistema rítmico e o sistema metabólico, que possuem correspondência às porções do corpo humano.  Trata-se da Organização Tríplice, fato que não deveria passar despercebido ao olhar do maçom que reflita sobre o Ternário.
O sistema neurossensorial tem como centro a porção superior do corpo, precisamente na região do crânio. Conforme a fisiologia apresenta é a sede das atividades nervosas, do polo encefálico, onde residem o pensamento e a consciência.
O estudo da fenomenologia do crânio expõe algumas características deste sistema que são a dureza, a falta de flexibilidade dos ossos, ausência de movimento, a calma (o cérebro é imóvel, sendo que inúmeras patologias decorrem de contusões ou de sua “agitação”). Outra característica desta porção é o frio e a presença dos processos de “morte”, que na fisiologia são representadas pela ausência de regeneração das células nervosas. De fato, todo o processo de tomada de consciência depende de processos catabólicos (destrutivos), ou seja, de destruição do sistema neurossensorial, onde no desconstruir produz-se consciência.
Similar ao artista que dá consciência ao bloco de pedra amorfo por meio dos entalhes – retirada de material para apresentação da forma – o sistema neurossensorial atua na “morte” para revelar o sentido.

Assim, o polo neurossensorial trata, sobretudo, da imaterialidade, das imagens advindas do mundo que foram captadas pelos órgãos dos sentidos, que são representações do mundo e não a materialidade do mundo propriamente dita.

O cérebro capta luz, aroma, gosto, sensações, som e ritmo, mas não as coisas em si. Por meio desse mecanismo, se constituem os pensamentos (combinações de imagens).  Podemos dizer, que é neste sistema que encontramos a máxima liberdade de nossa alma em relação a matéria.
De modo oposto, o sistema metabólico e dos membros possui seu centro na região inferior do corpo, em órgãos abaixo do diafragma, onde seu caráter flexível e de atividade está presente de modo explícito na funcionalidade das pernas, que nos permite deslocarmos para onde desejamos.

Deste aspecto emerge a noção de que este sistema é a sede do querer, da Vontade.  Todo este movimento é relacionado ao calor e de fato é indicativo da presença de grande concentração de energia, que pode dar origem aos processos inflamatórios.

Este é o polo gerador das substâncias do corpo, da digestão, da produção caótica de células, que se opõe radicalmente a calma e a morbidez neurossensorial.

O sistema metabólico nos alude a uma grande fábrica que transforma a matéria prima, produz seus resíduos e gera novas substancias. Considerando a “vocação” deste sistema para a produção, somente poderia situar-se neste sistema o sistema reprodutivo, a função de gerar a vida.
Completando a organização tríplice, o terceiro sistema emerge naturalmente como um meio de estabelecer o equilíbrio destes dois polos.

Assumindo o papel de entrar neste jogo forças, o sistema rítmico produz a “dança” do equilíbrio entre o calor e o frio, entre a vida e a morte, entre o pensar e o querer, entre a Vontade e a Inteligência.

Como parte da poesia deste encontro amoroso entre pensar e querer, o sentir se faz presente e toma como lar a respiração, a circulação e o coração.

O coração, em verdade, é uma verdadeira barreira sensível capaz de perceber e limitar as sobreposições do sistema superior em relação ao inferior e vice-versa.

 Quando a “música” soa fora de ritmo este é um sinal claro de que desarmonias ou desequilíbrios entre os sistemas estão ocorrendo.

Porém, os ritmos não são resultados de outros sistemas, mas estão ali como mediadores que ajudam na relação pensar e querer. Isto é perceptível tanto no ritmo cardíaco e nas patologias advindas do seu “descompasso”, com frequência associadas a emoções específicas.
É importante se entender que a organização tríplice não se trata de um privilégio do organismo humano, ela pode ser aplicada a todas as coisas existentes, onde não seria forçoso dizer que a presença das três forças seria uma condição essencial para todas as coisas existirem. Ainda que no homem vejamos o reflexo, o esplendor de todo o polo neurossensorial através da presença do pensamento, podemos dizer que as flores também engendraram todo o esplendor metabólico em sua grande variedade de aromas e cores com a máxima finalidade reprodutiva.

As rochas ígneas, o enxofre, traduz todo o calor metabólico em termos de minério, mas as rochas sedimentares por meio dos quartzos parecem expor toda a capacidade de ordem que o sistema neurossensorial alcança por meio do pensar humano.

Enquanto aos animais, uns mostram-se mais neurossensoriais como o polvo – praticamente ele é somente cabeça – e outros mais metabólicos como o boi – com mais de um estomago.

Mas ainda que existam tantas variações entre os seres e minerais no mundo, todos parecem guardar em si as três forças mais ou menos explícitas. Neste sentido, a homeopatia antroposófica buscará na natureza os elementos necessários para o resgate do equilíbrio.

O mais importante a ser refletido na organização tríplice é que toda essa diversidade que está presente dentro do homem, e está presente no mundo, parece em sua totalidade expor a presença de um organismo ainda maior que contém essas três forças, cujo homem é apenas vaga imagem e semelhança sujeito a ação de suas forças.

Quando o homem entende o lugar que ocupa no mundo e as forças que estão em ação sobre ele e tudo que o cerca, ele torna-se instrumentalizado para realizar as melhores escolhas no sentido de um razoável equilíbrio, buscando o que lhe falta e evitando o que lhe excede.
           
 
Referências bibliográficas
 
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