Ir.'. Ruy Luiz Ramires
publicado em 11/03/2010 - no site: www.deldebio.com.br
No início de 1934, logo após a ascensão de Adolf
Hitler ao poder, ficou claro que a maçonaria alemã corria o risco de
desaparecer.
E breve, a maçonaria alemã, que
conhecera dias gloriosos e que tivera, em suas colunas, os mais ilustres filhos
da pátria alemã, com Goethe, Schiller e Lessingn, veria esmagado o espírito da
liberdade sob o pretexto de impor a ordem e uma supremacia racial.
Quanto retrocesso desde que Friedrich
Wilhelm III, Rei da Prússia, em 1822, impediu que os esbirros reacionários da
Santa Aliança de Metternich fechassem as Lojas Maçônicas, declarando
peremptoriamente que poderia descrever os Franco-Maçons prussianos, com toda a
honestidade, como sendo os melhores dentre os seus súditos… (1)
As Lojas alemãs, na terceira década do século XX, estavam jurisdicionadas a
onze Grandes Lojas, divididas em duas tendências.
O primeiro grupo, de tendência
humanista, seguindo os antigos costumes ingleses, tinha como base a tolerância,
valorizando o candidato por seus méritos e não levando em consideração sua
crença religiosa.
Constava de sete Grandes Lojas, a
saber: Grande Loja de Hamburgo; Grande Loja Nacional da Saxônia, em Dresden:
Grande Loja do Sol, de Bayreuth; Grande Loja-Mãe da União Eclética dos
Franco-Maçons, em Frankfurt; Grande Loja Concórdia, em Darmstadt; Grande Loja
Corrente Fraternal Alemã, em Leipzig; e, finalmente, a Grande Loja Simbólica da
Alemanha.
O segundo grupo consistia das três
antigas Lojas Prussianas, que faziam a exigência de que os candidatos fossem
cristãos. Havia ainda a Grande Loja União Maçônica do Sol Nascente, não
considerada regular, mas que também tinha tendências humanistas e pacifistas.
Voltando a 1934, a Grande Loja Alemã
do Sol se deu conta do grave perigo que iria enfrentar. Inevitavelmente, os
maçons alemães estavam partindo para a clandestinidade, devido à radicalização
política e ao nacionalismo exacerbado. Muitos adormeceram e alguns romperam com
a tradição, formando uma espúria Franco-Maçonaria Nacional Alemã Cristã, sem
qualquer conexão com o restante da Franco-Maçonaria. Declaravam eles
abandonarem a idéia da universalidade maçônica e rejeitar a ideologia
pacifista, que consideravam como demonstração de fraqueza e como uma
degeneração fisiológica contrária aos interesses do estado!
Os maçons que persistiram em seus
ideais precisaram encontrar um novo meio de identificação que não o óbvio
Compasso & Esquadro, seguramente um risco de vida.
Há uma pequenina flor azul que é
conhecida, em muitos idiomas, pela mesma expressão: não-me-esqueças – o
miosótis.
Entenderam, nossos irmãos alemães, que esse novo emblema não atrairia
a atenção dos nazistas, então a ponto de fechar-lhes as Lojas e confiscar-lhes
as propriedades.
O miosótis, é também chamado de Vergissmeininnicht, em alemão; forget-me-not, em inglês; forglemmigef, em dinamarquês; ne-m'oubliez-pas, em francês; non-ti-scordar-di-me, em italiano e não-te-esqueças-de-mim, em português.
Diz a lenda que Deus assim chamou a florzinha porque ela não conseguia recordar-se do próprio nome. O nome miosótis (Myosotis palustris) significa orelha de camundongo, por causa do formato das pétalas.
Diz a lenda que Deus assim chamou a florzinha porque ela não conseguia recordar-se do próprio nome. O nome miosótis (Myosotis palustris) significa orelha de camundongo, por causa do formato das pétalas.
O folclore europeu atribui poderes
mágicos ao miosótis, como o de abrir as portas invisíveis dos tesouros do
mundo. O tamanho reduzido das flores parece sugerir que a humildade e a união
estão acima dos interesses materiais, porque é notada principalmente quando, em
conjunto, forma buquês no jardim.
De acordo com uma velha tradição
romântica alemã, o nome da flor está relacionado às últimas palavras de um
cavaleiro errante que, ao tentar alcançar a flor para sua dama, caíra no rio,
com sua pesada armadura e afogara-se.
Outra história diz que Adão, ao dar
nomes às plantas do Jardim do Éden, não viu a pequena flor azul. Mais tarde,
percorrendo o jardim para saber se os nomes tinham sido aceitos, chamou-as pelo
nome. Elas curvaram-se cortesmente e sussurravam sua aprovação. Mas uma voz
delicada a seus pés perguntou: “- E eu, Adão, qual o meu nome?” Impressionada
com a beleza singela da flor e para compensar seu esquecimento, Adão falou: “ –
Como eu me esqueci de você antes, digo que vou chamá-la de modo a nunca mais
esquecê-la. Seu nome será não-te-esqueças-de-mim.”
Através de todo o período negro do
nazismo, a pequenina flor azul identificava um Irmão. Nas cidades e até mesmo
nos campos de concentração, o miosótis adornava a lapela daqueles que se
recusavam a permitir que a Luz se extinguisse. (2)
O miosótis como símbolo foi objeto de
um interessante estudo do irmão David G. Boyd, no Philaletes de abril de 1987.
Ele conta, também, que muitos maçons recolheram e guardaram zelosamente jóias,
paramentos e registros das Lojas, na esperança de dias melhores. O irmão Rudolf
Martin Kaiser, VM da Loja Leopold zur Treue, de Karlsruhe, quebrou a jóia do
V.'. M.'. em pequenos pedaços de tal modo que não pudesse ser
reconhecida pela infame Gestapo.
Em 1945, o nazismo, com seu credo de
ódio, preconceito e opressão, que exterminara, entre outros, também muitos
maçons, era atirado no lixo da História. Nas fileiras vitoriosas que ajudaram a
derrotá-lo, estavam muitos maçons – ingleses, americanos, franceses,
dinamarqueses, tchecos, poloneses, australianos, canadenses, neozelandeses e
brasileiros. De monarcas, presidentes e comandantes aos mais humildes
pracinhas.
Mas, entre os alemães, alguns velhos
maçons também sobreviveram, seu sofrimento ajudando a redimir, de alguma forma,
a memória da histeria coletiva nazista. Eles eram o penhor da consciência
alemã, a demonstração de que a velha chama da civilização alemã continuara,
embora com luz tênue, a brilhar durante a barbárie.
Em 14 de junho de 1954, a Grande Loja
O Sol (Zur Sonne) foi reaberta, em Bayreuth, sob um ilustre irmão o Dr. Theo
Vogel, núcleo da Grande Loja Unida da Alemanha (VGLvD, AF&AM). Nesse
momento, o miosótis foi aprovado como emblema oficial da primeira convenção
anual, realizada por aqueles que conseguiram sobreviver aos anos amargos do
obscurantismo. Nessa convenção, a flor foi adotada, oficialmente, como um
emblema Maçônico, em honra àqueles valentes Irmãos que enfrentaram
circunstâncias tão adversas.
Certamente, na platéia, estava o
V.'. M.'. da Loja Leopold ZurTreue, agora nº 151, ostentando orgulhoso
sua jóia recuperada e reconstituída, suas emendas de solda constituindo-se num
testemunho mudo e comovente da história.
Finalmente, para coroar, quando
Grão-Mestres de todo o mundo encontraram-se nos Estados Unidos, o Grão-Mestre
da recém formada Grande Loja Unida da Alemanha (3) presenteou a todos os
representantes das Grandes Jurisdições ali presente com um pequeno miosótis
para colocar na lapela.
O miosótis também é associado com as
forças britânicas que serviram na Alemanha, em especial na região do Rio Reno,
logo após a guerra. Há uma Loja, jurisdicionada à Grande Loja Unida da
Inglaterra, a Forget-me-not Lodge nº 9035, Ludgershall, Wiltshire, que adotou a
flor como emblema. Foi formada especialmente para receber os militares ingleses
que retornavam do serviço na Alemanha.
Foi assim que essa mimosa florzinha
azul, tão despretensiosa, transformou-se num significativo emblema da
Fraternidade – talvez hoje o mais usado pelos maçons alemães.
Ainda hoje, na maioria das Lojas
germânicas, o alfinete de lapela com o miosótis é dado aos novos Mestres,
ocasião em que se explica o seu significado para que se perpetue uma história
de honra e amor frente à adversidade, um exemplo para as futuras gerações
Maçônicas de todas as nações.
Observações
Observações
1. ,Die Freimaurer –
The Freemasons, Lewis Masonic, edição em inglês, revisada, 1994.
2. O uso do miosótis como identificação secreta dos Maçons alemães, foi contestado no Square Magazine, de setembro de 1988, pelo Ir.'. Cyril Batham, Past Master da Loja Quatuor Coronati nº 2076, mas, em que pese toda a autoridade do irmão do Ir.'. Batham, ele apenas negou a autenticidade da estória, sem, entretanto, apresentar os motivos da negativa. Além disso, há anos que a casa Ian Alan Regalia, especializada em paramentos maçônicos, exibe o miosótis em gravatas, alfinetes de lapelae pendentes, em prata, ouro e bijuteria. Por que o fariam, se o miosótis não fosse tão importante?
3. Na formação da
Grande Loja unida da Alemanha aparecem 3 das Grandes Lojas existentes antes da
II Guerra Mundial: Grande Loja do Sol, em Bayreuth; Grande Loja de Hamburgo;
Grande Loja de Hesse, em Frankfurt (antiga União Eclética); Grande Loja de
Bremen; Grande Loja Unidade, em Baden-Baden; Grande Loja Nacional de
Niedercachse, em Hanover; Grande Loja Nacional de Nordrhein-Westfalen, em
Dusseldorf; Grande Loja Nacional de Schleswing-Holstein, em Luberck; e Grande
Loja de Wurttemberg-Baden, em Stuttgart. De acordo com o List of Lodges, em
2001 contava com 14.000 irmãos distribuídos em 490 Lojas.
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