O compasso, o esquadro e o olho: símbolos da sociedade secreta/ Crédito: Pixabay
Publicado em “Aventuras na História “- site da UOL
Por Tiago Cordeiro em 22/02/2017
O primeiro presidente dos Estados Unidos, George Washington, era maçom. Depois
dele, outros 16 líderes da nação mais poderosa do mundo também foram: a lista
inclui John Edgar Hoover, diretor do FBI por 45 anos, e Harry Truman, o homem
que autorizou o ataque com bombas atômicas sobre o Japão. Também fizeram parte
da sociedade secreta dois políticos decisivos para a vitória aliada na Segunda
Guerra Mundial, o presidente americano Franklin Delano Roosevelt e o
primeiro-ministro britânico Winston Churchill. Eram maçons alguns dos mais
importantes líderes da Revolução Francesa, como Jean-Paul Marat e La Fayette. O
revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi e os libertadores da América
espanhola, o argentino José de San Martín e o venezuelano Simon Bolívar,
também. O articulador da independência do Brasil, José Bonifácio de Andrada e
Silva, pertencia à ordem, assim como o duque de Caxias e nosso primeiro
presidente republicano, marechal Deodoro da Fonseca.
Por
tudo isso, não é exagero afirmar que o mundo em que vivemos foi definido por
essa sociedade secreta, que por três séculos vem reunindo a elite política e
militar (e cultural) do Ocidente em rituais cheios de códigos misteriosos.
Mas
o que é maçonaria? Existem várias versões para a criação da organização. A mais
confiável remete à Idade Média, quando o controle do comércio era feito pelas
guildas, corporações de ofício que reuniam artesãos do mesmo ramo e funcionavam
como um antepassado dos sindicatos. Um dos grupos mais poderosos era o dos
pedreiros (em inglês, masons). Que era um trabalho de alto status então,
pois eram responsáveis pela engenharia e pela construção de castelos e
catedrais. Pedreiros tinham acesso aos reis e ao clero e circulavam livremente
entre os feudos. Apelidados de free masons (pedreiros livres), se
reuniam nos canteiros de obras e trocavam segredos da profissão. Um dos
documentos mais antigos sobre essas guildas é a carta de regulamentos de
Londres, 1356. Na época, era só um conjunto de regras para pedreiros.
Para
se identificarem em locais públicos e evitarem o vazamento de suas conversas,
criaram um sistema de gestos e códigos. Durante o Renascimento, os pedreiros
livres ficaram na moda. Seus encontros passaram a acontecer em salões, chamados
de lojas, que geralmente ficavam sobre bares e tavernas das grandes cidades,
onde a conversa continuava depois. Intelectuais e membros da nobreza
engrossaram a turma. Por influência deles, os debates passaram a abranger
religião e filosofia. Em 24 de junho de 1717, numa reunião das quatro maiores
lojas de Londres (então o maior centro maçom europeu), na taverna The Goose and
Gridiron nasceu uma federação, a Grande Loja de Londres. Era o início oficial
da maçonaria.
A Marselhesa
Em
apenas três décadas, a organização já tinha se espalhado por toda a Europa
ocidental e havia alcançado a Índia, a China e a América do Norte. Passou a ser
conhecida, respeitada, mas, principalmente, temida. Não era para menos. Ficava
difícil confiar em um grupo de homens ricos e poderosos, de diferentes áreas,
que se reuniam a portas fechadas, usavam símbolos esquisitos (veja explicações
ao longo da reportagem) e faziam juramentos de fidelidade à tal organização e
ainda voto de silêncio. Também não ajudou muito o tanto de lendas que surgiu
sobre a origem da maçonaria (em 1805, o historiador francês Charles Bernardin
pesquisou 39 diferentes). Tinha para todos os gostos: alguns integrantes da
ordem diziam que Noé era maçom, outros transformaram o rei Salomão ou os
antigos egípcios em fundadores. Nem os templários escaparam (leia ao final). A
Igreja Católica se incomodou tanto que, em 1738, divulgou uma bula papal
atacando a ordem, que décadas depois foi perseguida pela Inquisição.
O revolucionário
italiano Giuseppe Garibaldi e os libertadores da América espanhola, o argentino
José de San Martín e o venezuelano Simon Bolívar, também. O articulador da
independência do Brasil, José Bonifácio de Andrada e Silva, pertencia à ordem,
assim como o duque de Caxias e nosso primeiro presidente republicano, marechal
Deodoro da Fonseca.
Por
tudo isso, não é exagero afirmar que o mundo em que vivemos foi definido por
essa sociedade secreta, que por três séculos vem reunindo a elite política e
militar (e cultural) do Ocidente em rituais cheios de códigos misteriosos.
Mas
o que é maçonaria? Existem várias versões para a criação da organização. A mais
confiável remete à Idade Média, quando o controle do comércio era feito pelas
guildas, corporações de ofício que reuniam artesãos do mesmo ramo e funcionavam
como um antepassado dos sindicatos. Um dos grupos mais poderosos era o dos
pedreiros (em inglês, masons). Que era um trabalho de alto status então,
pois eram responsáveis pela engenharia e pela construção de castelos e
catedrais. Pedreiros tinham acesso aos reis e ao clero e circulavam livremente
entre os feudos. Apelidados de free masons (pedreiros livres), se
reuniam nos canteiros de obras e trocavam segredos da profissão. Um dos
documentos mais antigos sobre essas guildas é a carta de regulamentos de
Londres, 1356. Na época, era só um conjunto de regras para pedreiros.
Para se identificarem em locais públicos e evitarem
o vazamento de suas conversas, criaram um sistema de gestos e códigos. Durante
o Renascimento, os pedreiros livres ficaram na moda. Seus encontros passaram a
acontecer em salões, chamados de lojas, que geralmente ficavam sobre bares e
tavernas das grandes cidades, onde a conversa continuava depois. Intelectuais e
membros da nobreza engrossaram a turma. Por influência deles, os debates
passaram a abranger religião e filosofia. Em 24 de junho de 1717, numa reunião
das quatro maiores lojas de Londres (então o maior centro maçom europeu), na
taverna The Goose and Gridiron nasceu uma federação, a Grande Loja de Londres.
Era o início oficial da maçonaria.
Mistérios revelados
Os principais símbolos da maçonaria
Compasso
Um dos instrumentos dos pedreiros. Representa a racionalidade científica. Por desenhar círculos perfeitos, também simboliza a busca pela perfeição moral.
Esquadro
Outro instrumento da construção civil que lembra a capacidade transformadora do homem sobre a natureza. Seu ângulo reto é uma indicação para os homens de que eles devem ser honestos
Letra G
Outro instrumento da construção civil que lembra a capacidade transformadora do homem sobre a natureza. Seu ângulo reto é uma indicação para os homens de que eles devem ser honestos
Letra G
Vem de God, (Deus, em inglês). Os integrantes da fraternidade também o chamam de GAU, sigla para “Grande Arquiteto do Universo”.
Geralmente representado dentro de um triângulo, tem o mesmo significado da letra G. É Deus, que tudo vê.
Triângulo
Refere-se ao lema “liberdade, igualdade e fraternidade”, às virtudes: fé, esperança e caridade, e nascimento, vida e morte. Por isso, os maçons também fazem três pontos em suas assinaturas.
Refere-se ao lema “liberdade, igualdade e fraternidade”, às virtudes: fé, esperança e caridade, e nascimento, vida e morte. Por isso, os maçons também fazem três pontos em suas assinaturas.
Pequeno, simboliza o trabalho dos pedreiros que inspiraram a fraternidade, e também a força material que muda o mundo. É usado pelo grão-mestre durante as cerimônias.
Sol/Lua
Como o chão de mosaico preto e branco (veja no rodapé da reportagem), usado nas lojas, simboliza a dualidade entre bem e mal, espírito e corpo, luz e trevas
Como o chão de mosaico preto e branco (veja no rodapé da reportagem), usado nas lojas, simboliza a dualidade entre bem e mal, espírito e corpo, luz e trevas
Além do sigilo, o que perturbava era
a atitude sempre à frente de seu tempo. Setenta anos antes da Revolução
Francesa, esses homens cultos e influentes já defendiam a liberdade, a
igualdade e a fraternidade. Tratavam-se sem distinção e aceitavam todos os
credos religiosos, uma atitude tremendamente avançada para a época. Os ateus,
porém, eram barrados. “Não formamos uma religião,
mas somos um grupo de pessoas religiosas. Nosso lema é
fazer os homens bons ficarem melhores”, diz o maçom
paulistano Cassiano Rampazzo, advogado de 35 anos. Com ele concorda a
historiadora mineira Françoise Jean de Oliveira, co-autora do livro “O Poder
da Maçonaria”.
“A maçonaria
não é religião, não tem dogmas. É um
grupo que defende a liberdade de consciência e o progresso. Isso não
quer dizer que cada participante possa agir como bem entende”. Ao entrar na
ordem, o membro é instruído sobre a “moral universal”, um
conjunto de virtudes obrigatórias, como bondade, lealdade, honra,
honestidade, amizade, tranquilidade e obediência,
diz Françoise.
A falta de preconceito se restringia
a diferenças políticas e religiosas. A fraternidade
vetava analfabetos, deficientes e homens que não se sustentavam. As mulheres
até hoje não são bem-vindas (com exceção da França). Além disso, no passado
como no presente, só entra na ordem quem for convidado e passar por uma avaliação
rigorosa: nada de gente indiscreta, protagonistas de escândalos, bêbados,
brigões e adúlteros notórios. “Ainda assim, para os aprovados, a maçonaria foi
a primeira entidade a funcionar de acordo com os preceitos da democracia
moderna. Eles estimulavam debates abertos, em que todos podiam participar, além
das eleições livres e diretas. Nada disso estava na moda no século 18. E, muito
por influência dos próprios maçons, tornou-se corriqueiro no século 21”,
afirma o historiador alemão Jan Snoek, professor da Universidade de
Heidelberg e especialista no assunto.
Assim, nada mais natural que os
líderes da Revolução Francesa de 1789 aderissem à maçonaria. Nos anos que
antecederam a queda do Antigo Regime, os adeptos se multiplicaram. A influência
foi tanta que uma canção composta e cantada na loja de Marselha foi batizada de
“A Marselhesa” e transformada no hino do país. Nem todos os ideólogos
da revolução foram maçons. Marat e La Fayette eram,
Robespierre e Danton, não. Mas, entre os inimigos da monarquia, mesmo quem
não participava da ordem tinha sido influenciado por suas idéias, afirma
o historiador americano W. Kirk MacNulty, maçom há mais de 40 anos.
Nas verdinhas
Nas verdinhas
Além de divulgar ideias que atraíam a
elite progressista de seu tempo, a maçonaria era também um espaço propício à
conspiração política. Ao ingressar na ordem, os integrantes prometiam (e até
hoje prometem) não divulgar seus segredos e nem mesmo revelar a nenhum profano
(como são chamados os não-iniciados) o que é dito nas reuniões. As lojas
maçônicas eram o lugar ideal para membros da elite de diferentes pensamentos
políticos se encontrarem, diz o pesquisador Jesus Hortal, reitor da Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro. Além
disso, quanto mais a maçonaria era acusada de ser um local de conspiração
política, mais ela era procurada por conspiradores. A proteção das lojas ajudou
a garantir o sucesso de um dos movimentos históricos mais influenciados pela
organização: a independência americana, episódio que muitos historiadores chamam
de “revolução maçônica”.
Grandes maçons
Algumas figuras centrais que se
juntaram à ordem
O general e presidente George Washington em vestimentas maçons / Wikimedia Commons
George Washington (1732-1799)
Juntou-se bem jovem, enquanto ainda era soldado do Exército britânico, em 1752. Ocupado com sua luta, nunca foi muito ativo. Recusou o cargo de Grande Mestre na Virgínia em 1777, para se dedicar à luta contra a dominação britânica. Deram o cargo mesmo assim, sem seu consentimento, em 1788. Washington gostava do programa iluminista dos maçons, e também do fato de, nos EUA, serem menos anticlericais que na Europa.
Juntou-se bem jovem, enquanto ainda era soldado do Exército britânico, em 1752. Ocupado com sua luta, nunca foi muito ativo. Recusou o cargo de Grande Mestre na Virgínia em 1777, para se dedicar à luta contra a dominação britânica. Deram o cargo mesmo assim, sem seu consentimento, em 1788. Washington gostava do programa iluminista dos maçons, e também do fato de, nos EUA, serem menos anticlericais que na Europa.
Voltaire (1694-1778)
O filósofo iluminista atacava a monarquia francesa e defendia princípios maçons. Acabou sendo iniciado em uma loja de Paris em abril de 1778, só dois meses antes de morrer. Voltaire, que tinha 83 anos, entrou no local apoiado no braço do americano Benjamin Franklin.
O filósofo iluminista atacava a monarquia francesa e defendia princípios maçons. Acabou sendo iniciado em uma loja de Paris em abril de 1778, só dois meses antes de morrer. Voltaire, que tinha 83 anos, entrou no local apoiado no braço do americano Benjamin Franklin.
Goethe (1749-1832)
O escritor e poeta alemão foi aceito em uma loja de Weimar em 1780. Escreveu vários poemas em homenagem à maçonaria. Os mais famosos são “A Loja Maçônica” e “Symbolum” (composto quando seu único filho, Auguste, foi iniciado).
O escritor e poeta alemão foi aceito em uma loja de Weimar em 1780. Escreveu vários poemas em homenagem à maçonaria. Os mais famosos são “A Loja Maçônica” e “Symbolum” (composto quando seu único filho, Auguste, foi iniciado).
Mozart (1756-1791)
O compositor austríaco entrou para a ordem em Viena, aos 28 anos. Compôs várias peças para serem executadas durante cerimônias maçônicas. Sua última ópera, A Flauta Mágica, tem tantas referências à ordem que Mozart foi acusado de revelar segredos maçons.
O compositor austríaco entrou para a ordem em Viena, aos 28 anos. Compôs várias peças para serem executadas durante cerimônias maçônicas. Sua última ópera, A Flauta Mágica, tem tantas referências à ordem que Mozart foi acusado de revelar segredos maçons.
Gustave Eiffel (1832-1923)
Além de projetar a Torre Eiffel, em Paris, o engenheiro francês desenhou a Estátua da Liberdade, enviada como presente de comemoração dos 100 anos da independência americana . O projeto foi executado em parceria com o escultor Frederick Bartholdi (1834-1904), que também era maçom.
Além de projetar a Torre Eiffel, em Paris, o engenheiro francês desenhou a Estátua da Liberdade, enviada como presente de comemoração dos 100 anos da independência americana . O projeto foi executado em parceria com o escultor Frederick Bartholdi (1834-1904), que também era maçom.
Charles Lindberg (1902-1974
O aviador foi aceito por uma loja de Saint Louis em 1926. No ano seguinte, tornou-se o primeiro homem a fazer um vôo solitário transatlântico sem escalas. Durante a viagem, ele teria levado consigo um distintivo com os símbolos da régua e do compasso.
”Buzz”
Aldrin (1930)O aviador foi aceito por uma loja de Saint Louis em 1926. No ano seguinte, tornou-se o primeiro homem a fazer um vôo solitário transatlântico sem escalas. Durante a viagem, ele teria levado consigo um distintivo com os símbolos da régua e do compasso.
O segundo homem a pisar na Lua em 1969, após Neil Armstrong, pertence a uma loja maçônica no Texas. Queria ter levado um anel maçom de seu avô para a Lua, mas o perdeu antes da viagem. Mas ninguém sabe se ele teria mesmo levado uma bandeira com símbolos da ordem para lá.
Benjamin
Franklin, um
dos grandes responsáveis pela criação dos Estados Unidos da América, era
grão-mestre (o líder máximo na hierarquia) na Filadélfia e responsável pela
publicação no país do livro Constituições, escrito pelo britânico James
Anderson em 1723 e considerado a declaração de princípios da entidade. O líder
dos rebeldes, George Washington, e o principal autor da Declaração de
Independência, Thomas Jefferson, também eram membros ativos, assim como um
terço dos 39 homens que aprovaram a primeira Constituição do país. Os três
usaram seus contatos com as maçonarias de outras nações, em especial da
Inglaterra, para garantir o sucesso da rebelião.
Há quem diga que a nota de 1 dólar, com seu olho
solitário, é inteiramente marcada por símbolos maçons, o olho, por exemplo,
simbolizaria Deus (leia sobre os símbolos no decorrer da reportagem), coisa que
os autores da cédula nunca confirmaram. Reza a lenda que George Washington
teria vestido um avental da ordem durante a inauguração da capital, em 16 de
julho de 1790, batizada em sua homenagem. Ele ainda teria orientado os
engenheiros a encher a cidade de símbolos secretos da entidade. Por exemplo:
algumas pessoas identificam o desenho de um compasso unindo a cúpula do
Capitólio, a Casa Branca e o Memorial Thomas Jefferson.
Pelo mundo
No século 19, a maçonaria deu outras provas de sua
capacidade de mudar a história. Por volta de 1810, um grupo de defensores da
unificação italiana se reuniu com o nome de Carbonária. Inspirado nas
estratégias e na hierarquia maçons, a sociedade secreta, que continuou atuante
até 1848, tentava estimular uma rebelião espontânea dos trabalhadores, que
implantariam os ideais liberais. Dois dos maiores heróis da construção da
Itália unificada participaram desse grupo e depois foram aceitos pela
maçonaria. Um deles, Giuseppe Mazzini (1805-1872), acabou rompendo com os
maçons por acreditar que a ordem mais debatia que agia. Outro, Giuseppe
Garibaldi (1807-1882), seria mais tarde condecorado o primeiro maçom do novo
país.
Depois de participar de um levante malsucedido em Gênova, Garibaldi fugiu para o Rio de Janeiro em 1835. Encontrou um grupo de carbonários exilados que mantinha contatos com a maçonaria brasileira. Através deles conheceu o maçom Bento Gonçalves, o líder da Revolução Farroupilha. Em 1840, Garibaldi instalou-se no Uruguai, onde se tornou oficialmente participante da sociedade secreta. Quando morreu, em seu país, deu nome a lojas no Uruguai, Brasil, França, Estados Unidos, Inglaterra e Itália. Nas décadas seguintes, os democratas italianos de esquerda, cujos integrantes cerrariam fileiras na maçonaria, se destacaram pela defesa do sufrágio universal, da educação gratuita de qualidade e da independência do Estado com relação à Igreja.
Depois de participar de um levante malsucedido em Gênova, Garibaldi fugiu para o Rio de Janeiro em 1835. Encontrou um grupo de carbonários exilados que mantinha contatos com a maçonaria brasileira. Através deles conheceu o maçom Bento Gonçalves, o líder da Revolução Farroupilha. Em 1840, Garibaldi instalou-se no Uruguai, onde se tornou oficialmente participante da sociedade secreta. Quando morreu, em seu país, deu nome a lojas no Uruguai, Brasil, França, Estados Unidos, Inglaterra e Itália. Nas décadas seguintes, os democratas italianos de esquerda, cujos integrantes cerrariam fileiras na maçonaria, se destacaram pela defesa do sufrágio universal, da educação gratuita de qualidade e da independência do Estado com relação à Igreja.
É fácil entender como Garibaldi se tornou maçom na
América do Sul. Desde o começo do século 19, a ordem cresceu a ponto de ser
fundamental para a independência dos países da região. Nos países de língua
espanhola, um dos precursores do pensamento pela soberania foi o venezuelano
Francisco de Miranda (1750-1816), que, depois de participar da Revolução
Francesa, foi iniciado na maçonaria por George Washington. Miranda fundou uma
loja em Londres, batizada de Gran Reunión Americana. Ali, atuou na formação de
três libertadores da América: o chileno Bernardo O’Higgins (1778-1842), o
venezuelano Simon Bolívar (1783-1830) e o argentino José de
San Martín (1778-1850). Eles frequentavam
a mesma loja, Latauro, com sede em Cádiz, Espanha, e filiais
latino-americanas. Seus membros se denominavam “cavaleiros da razão” e
previam a independência, o fim da escravidão e a
proclamação de repúblicas. Estima-se que a iniciação de
Bolívar tenha ocorrido na Europa, entre 1803 e 1806.
San Martín, adepto desde 1808, fundou lojas no Chile, no
Peru e na Argentina (que já abrigava casas maçônicas desde
1775). Higgins frequentava a de Mendoza.
Em terras brasileiras
A fraternidade existia em nosso país desde o início
do século 19 e contava com confrades de altos cargos da colônia. Entre os
maçons decisivos para a separação de Portugal estava José Bonifácio de Andrada
e Silva (1763-1838). A idéia de conceder o título de “Defensor Perpétuo e
Imperador do Brasil” ao príncipe herdeiro da coroa portuguesa
surgiu na própria Latauro, mesmo lugar que organizou as
primeiras festas de rua pela independência, no Rio, em 12 de outubro de 1822. O
envio de emissários às grandes províncias brasileiras para articulação da
Independência foi organizado pelo Grande Oriente do Brasil, a federação
maçônica nacional fundada em 17 de junho do mesmo ano, de onde José Bonifácio
foi grão-mestre. Em 2 de agosto de 1822, o próprio dom Pedro I entrou para a
entidade, sob o codinome Pedro Guatimozim, uma homenagem ao último rei asteca.
Apenas três dias depois de iniciado, ele já tinha sido alçado a mestre. Mais dois
meses e já era o grão-mestre do país. Passados apenas 17 dias da promoção,
Pedro, já imperador, abandonou a fraternidade e proibiu suas atividades no
Brasil. A melhor explicação dos especialistas para a atitude é a insatisfação
do monarca com uma entidade onde a hierarquia era submetida a regras e podia
ser questionada.Em terras brasileiras
Em 1831, de volta legalmente à ativa, após a renúncia de dom Pedro e seu retorno a Portugal, a maçonaria brasileira se multiplicou. Em 1861, a ordem se mobilizou em apoio ao movimento abolicionista. No Ceará, lojas se reuniram para comprar e libertar escravos. Eusébio de Queiroz (1812-1868), que batizou a lei que proibia o tráfico de escravos, era maçom. O visconde do Rio Branco (1819-1880), abolicionista e chefe de Gabinete Ministerial entre 1871 e 1875, foi grão-mestre. Quando a Lei Áurea foi assinada pela princesa Isabel (1846-1921), em 1888, o presidente do Conselho de Ministros era o grão-mestre João Alfredo Correa de Oliveira (1835-1919). Das lojas também veio o apoio à mudança no regime de governo. Em 1889, a República foi proclamada pelo confrade marechal Deodoro da Fonseca (1827-1892), que formou um ministério só com maçons. Dos 12 chefes de Estado até 1930, oito eram maçons; dos 17 governadores de São Paulo durante a República Velha, 13 pertenciam à ordem.
Caça aos bruxos
A partir de 1930, com a ascensão de Getúlio Vargas
(1882-1954) ao poder, a maçonaria brasileira passou a ser estigmatizada. Os
delírios do integralista Gustavo Barroso (1888-1959), de que a entidade
unira-se ao judaísmo para controlar a humanidade, faziam sucesso. O mesmo surto
ocorreu em outros países. Na União Soviética, Leon Trótski (1879-1940)
denunciou um suposto complô maçom-judaico para dominar o planeta. Adolf Hitler
(1889-1945), que dizia que a maçonaria era uma arma dos judeus, mandou fechar
todas as lojas alemãs, prendeu líderes e, em 1937, organizou a Exposição
Antimaçônica. Aberta em Munique pelo ministro da propaganda, Joseph Goebbels, a
mostra reunia peças de lojas invadidas. Na Espanha, em 1940, o general
Francisco Franco (1892-1975) proibiu a existência dos grupos e condenou seus
membros a seis anos de prisão.
Nem só a perseguição fez organização perder poder. A
maçonaria não se adaptou aos novos tempos, diz
Françoise Souza. Ela foi poderosa enquanto era um local único
de reunião de pessoas. Com a consolidação da
sociedade civil, surgiram outros espaços associativos, como partidos,
sindicatos e organizações não-governamentais. Além disso, causas clássicas da
maçonaria, como a liberdade religiosa, viraram direitos. Mas ainda existem
locais onde a segurança e a valorização da liberdade de expressão são
fundamentais. É o caso de Israel. Em Jerusalém, as lojas reúnem
cristãos, judeus e muçulmanos, que conversam abertamente,
trocam experiências e sabem que podem confiar uns nos outros,
afirma o historiador Jan Snoek. Em lugares assim a maçonaria
continua, como era em suas origens, uma organização inovadora.
Fundadores legendários
Estes seriam os primeiros maçons, segundo as lendas
Estes seriam os primeiros maçons, segundo as lendas
Crédito: Pixabay
Adão
Alguns integrantes da ordem defendem que Deus foi o primeiro maçom, afinal (como um bom “pedreiro”) ele construiu o mundo inteiro em seis dias. Para outros, esse cargo cabe a Adão. Ao ser expulso do paraíso, ele teve de encontrar uma forma de construir abrigo. Seus ensinamentos teriam sido levados adiante por seu filho Caim.
De acordo com a Bíblia, depois de construir um barco e escapar do grande dilúvio com um casal de cada espécie animal, Noé precisou começar tudo do zero. Para alguns maçons, isso faz dele um pioneiro na arte da construção logo, um fundador da maçonaria.
Egípcios
Só mesmo grandes engenheiros seriam capazes de construir as pirâmides do Egito antigo. Por isso, não falta quem diga que entre os egípcios também estavam os primeiros maçons. Por essa versão, eles teriam criado ritos ocultos, os mesmos que teriam usado na construção da Grande Pirâmide de Quéops.
Hiram Abiff
Segundo a Bíblia, o rei Salomão teria contratado um
outro rei, chamado Hiram Abiff, para ser o engenheiro-chefe de seu templo. De
acordo com a maçonaria, Hiram foi morto por funcionários que queriam roubar os
segredos de Salomão. Assim, Hiram acabou virando um mártir e também um exemplo
de discrição.
Pitágoras
Além de fundador da Matemática como disciplina de estudos, o grego fundou a escola pitagórica, que tratava seus seguidores como uma irmandade sem superiores e seguia rígidos princípios religiosos e de comportamento. Assim, não é difícil entender a ligação que fizeram entre ele e a maçonaria.
Além de fundador da Matemática como disciplina de estudos, o grego fundou a escola pitagórica, que tratava seus seguidores como uma irmandade sem superiores e seguia rígidos princípios religiosos e de comportamento. Assim, não é difícil entender a ligação que fizeram entre ele e a maçonaria.
Templários
Os sobreviventes da poderosa ordem, destruída em 1312 a mando do papa Clemente V, teriam continuado a se reunir em segredo até voltar a público em 1717, na forma da maçonaria. Algumas palavras
em código dos maçons seriam inspiradas nas senhas usadas pelos templários.
Os sobreviventes da poderosa ordem, destruída em 1312 a mando do papa Clemente V, teriam continuado a se reunir em segredo até voltar a público em 1717, na forma da maçonaria. Algumas palavras
em código dos maçons seriam inspiradas nas senhas usadas pelos templários.
SAIBA MAIS:
A Maçonaria Símbolos, Segredos, Significado, W. Kirk MacNulty, Martins Fontes, 2007
Arquivos Secretos do Vaticano e a Franco-Maçonaria, José Ferrer Benimeli, Madras, 2007
O Poder da Maçonaria, Françoise Jean de Oliveira e Marco Morel, Nova Fronteira, 2008